quinta-feira, 18 de julho de 2013

A última batalha de Soares!


        


 Antes de começar, não posso deixar de referir o devido respeito que nutro pela figura do Dr. Mário Soares e o reconhecimento inequívoco do seu papel na vida democrática de Portugal.
         Contudo, não posso deixar de censurar a sua postura nos últimos dois anos e a forma como tenta exercer pressão quer sobre o seu partido, quer sobre os órgãos de soberania e a sociedade civil.
         Soares assumiu desde cedo que a sua maior prioridade é derrubar o Governo de Pedro Passos Coelho. Posto isto, de  tudo tem feito para o conseguir, desprestigiando-se por vezes, com posições e discursos inflamados e demagógicos que em nada contribuem para o bem do país e para um diálogo  frutífero sobre a situação nacional.
         Vivemos tempos de extrema dificuldade e o presente governo tem tomado medidas altamente impopulares, algumas absolutamente necessárias, outras, mais questionáveis.  Contudo, aquilo que desgastou o governo e o desacreditou junto das pessoas, não creio que tenham sido tanto as medidas, mas a forma desastrosa de as comunicar, o extremismo com que assumiram algumas posições, a inexperiência que o Primeiro Ministro e alguns ministros revelaram na condução das suas pastas, a descoordenação política e por fim, a queda para o mediatismo e para o protagonismo individual que  alguns ministros evidenciaram, começando com Miguel Relvas fazendo uma declaração pública  de demissão muito contrastante para quem não tinha forças anímicas, seguindo-se da carta de Vítor Gaspar, absolutamente ridícula e censurável para quem fora Ministro de Estado e deveria revelar sentido de Estado e por último, o deplorável espectáculo de Paulo Portas com a sua carta de irrevogabilidade.
         Tudo isto deve ser alvo de censura, obviamente. Porque revela o desnorte dos nossos políticos  e o desrespeito  e despudor perante todos os portugueses que ao longo destes dois anos, têm suportado pacientemente e ainda que com muita dificuldade as mais diversas adversidades : brutal aumento de impostos, perda do poder de compra, desemprego, entre outras.
         Todavia toda esta calma não advém de poderosas capacidades de abstração do povo lusitano, mas sim da crença que muito daquilo que está a ser decidido é inevitável. E é aqui que a demagogia dos partidos os fere brutalmente.
É ÓBVIO que temos de cortar na despesa, ÓBVIO. E o PS aperceber-se-á , se não percebeu já, que o seu discurso anti-austeridade e facilitista não tem aderência à realidade. Seguro até agora, revelou-se um vazio de ideias, apenas propôs duas coisas tão vagas e incertas que não convenceram ninguém: negociar com a Europa melhores condições e mais dinheiro e menos juros. Contudo, sejamos francos, se isto fosse tão fácil e exequível não estaria já resolvido? Pois é, Seguro quer ser Primeiro-Ministro com base na boa vontade da Europa e isso é como tentar conter um punhado de areia numa peneira. Pior, é ser demagógico, porque desenganem-se que tudo isto resulta de uma posição de subserviência de Passos Coelho a Merkel, pois recordo que Sócrates também a tinha. E todos na Europa a têm, até o delfim François Hollande que prometia salvar a Europa e nem o seu país parece ser capaz de salvar.
         Também o PSD foi vítima da demagogia partindo para eleições em 2011 dizendo que bastaria cortar nas gorduras do Estado, apontando gastos excessivos com gabinetes, frota do Estado e Parcerias Público-Privadas, (PPP's) entre outros. Só  que isso não representa o grosso da despesa. E agora quando é necessário mexer no Estado Social e reformar o Estado, o PSD fica sem chão, porque prometeu um caminho de corte fácil, que não é suficiente. E ainda que já tenha cortado muito, cerca de 10 mil milhões de Euros na despesa pública do Estado, o que é óptimo, renegociando PPP's e as rendas excessivas no sector eléctrico, parando obras desnecessárias, cortando em áreas apontadas na campanha eleitoral, entre outras medidas, chegou a altura de cortar onde é mais difícil e depois de tanto ter aumentado impostos, alguns deles, como o caso do IVA na restauração, que representa um erro CRASSO na política económica do governo e que gerou imenso desemprego, há um enorme atrito a tudo o que é anunciado pelo governo.
         Alguns especialistas e analistas, apontam que o nosso País tem de ter uma despesa pública de cerca de 70 mil milhões de Euros para que consiga ser suportada pela Economia que temos, e em 2011, o valor da despesa era de 90 mil milhões. Até agora, o governo já cortou 10 mil milhões e a guerra que se trava hoje, é pelo corte de mais 4.700 mil milhões de Euros.
         Penso que é inevitável, com um Estado Social construído em toda a Europa com base num crescimento anual de cerca de 6% do PIB algo que não se verifica a algumas décadas e em Portugal, muito menos, na última década crescemos cerca de 1%; com um país e com uma Europa desindustrializados e com débeis níveis de crescimento  e altos níveis de desemprego, torna-se absolutamente necessário ajustarmos o nosso Estado Social e as funções do Estado. Contudo, defendo que tem de ser algo bem estudado e programado, não podem ser cortes cegos, feitos num ano. E  é esta questão que faz com que os Partidos se tenham de unir, como apelou o Presidente da República.
         Independentemente da crise política que se gerou na maioria parlamentar e que em situações normais, mereceria a dissolução do parlamento, a generalidade das pessoas entende que eleições antecipadas não seriam a melhor opção. E de facto, não seriam, porque o PS ainda não está preparado para governar, porque a Reforma do Estado tem de ser feita e tem de haver estabilidade nos próximos anos, para retomarmos o crescimento e efectuarmos reformas estruturais. Assim, têm de se criar compromissos entre os vários partidos, que assegurem que certos pilares serão respeitados e seguidos, sejam quais forem os partidos que estejam no governo.
         Desta feita, acho inadmissível que Mário Soares venha agora pressionar António José Seguro com uma possível cisão no Partido Socialista e dizendo que "ficaria muito chateado" com um possível acordo. É profundamente lamentável. Tudo tem de mudar Dr. Mário Soares e se tiverem de haver cisões nos vários partidos da governação, se surgirem novos partidos e se os mesmos se abrirem à sociedade civil (o que mais tarde ou mais cedo, acontecerá), é sinal que a democracia está a crescer e a ser mais exigente.
         Não sei qual será o desfecho destas negociações, mas não posso deixar de elogiar a postura de António José Seguro, que  soube estar à altura do que lhe era pedido e teve a maturidade suficiente para entrar no diálogo e enfrentar o Partido, a bem do país.
         Mário Soares tem de entender que o seu tempo acabou. O eterno líder do PS deixou de o ser, Mário Soares já não é mais líder partidário, já não é mais Primeiro-Ministro ou Presidente da República. Não lhe cabe a ele definir o que Partido Socialista faz, condicionar a acção do secretário geral do Partido e dizer ao Primeiro-Ministro e ao Presidente da República o que hão-de fazer. Há um desespero em Mário Soares, que além de ser triste, só lhe retira a credibilidade. Vejamos a sequência de acontecimentos -  falta às cerimónias do 25 de Abril por protesto contra o Governo, sendo um antigo Presidente da República tem o dever de saber que essas cerimónias, são de carácter parlamentar e onde o governo nem faz uso da palavra, assim, só fortaleceu ainda mais o governo, dando-lhe protagonismo numa situação onde não o tinha; de seguida, cria uma convenção de todas as esquerdas onde tenta criar uma coligação dos partidos à esquerda, para um possível governo, mas António José Seguro desmarca-se (e bem!) e nem comparece à iniciativa; seguem-se declarações ridículas onde diz temer pela vida de Cavaco e Passos Coelho, pois por muito menos, Sidónio Pais foi assassinado e por último, não posso deixar de referir a tentativa falhada de sedução que iniciou a Paulo Portas e ao CDS, começando por dizer que Paulo Portas tinha sido humilhado pelo governo, que merecia consideração e que estava a ser chantageado, tese que acabou no momento em que Portas aceita ser vice-primeiro-ministro, algo que o irritou profundamente e que o fez baptizá-lo de "salta-pocinhas".
         Tudo isto é lamentável. Num momento tão delicado que se vive desde a entrada da Troika em Portugal, com tanto ruído e com uma necessidade enorme de sensatez naquilo que se diz, Mário Soares, vem a cada dia desbaratar ainda mais a sua figura de Senador da República e assim, revela, em detrimento da postura oposta e sábia de Jorge Sampaio, que se tem revelado profundamente sensato naquilo que defende e um grande Estadista, que não sabe exercer da melhor forma o papel de Senador da República, pois ainda não entendeu que é altura de se retirar do ringue e deixar que os seus "filhos" e "netos" combatam. 
         O seu papel exige recato, Ramalho Eanes e Jorge Sampaio bem o sabem, pois afinal de contas, como o povo diz "a mesma água não passa duas vezes pelo mesmo moinho" e a miríade de declarações de Mário Soares em nada ajudam o país e só lhe retiram a força e a credibilidade que por direito lhe eram reconhecidas.
         Temo que esteja a ficar sozinho no seu campo de batalha e que a sua cruzada contra o governo já não seja sequer a prioridade do seu partido. Pois até o seu partido, já percebeu que o que se vive e o que nos é exigido a todos e ainda mais aos responsáveis políticos, ultrapassa e muito a vida deste governo e exige o  compromisso e o esforço mútuo de todos. Por conseguinte, por muito que não se goste deste governo e há razões para isso, a solução não passa pela queda imediata dele e pela eleição do PS com um programa cheio de facilidades e utopias, porque seria uma fraude. Nada será fácil e Mário Soares não conseguiu vingar com a sua ideia  de que basta Passos Coelho cair e tudo ficará bem. O governo irá cair seja daqui a um ano, seja em 2015, mas penso que Mário Soares não poderá reclamar vitória de nada, pois escapou-se-lhe das mãos qualquer hipótese de protagonismo. Quando acontecer, acontecerá porque assim tinha de ser e talvez aí, perceba que desperdiçou muito da sua figura ao descer a um patamar do qual já se tinha elevado.

2 comentários:

  1. Quanto a Mário Soares, creio que a senilidade por vezes lhe prejudica o raciocínio - ele foi quem mais alianças fez nos governos PS.

    Quanto ao governo, de quem me prometi a minha eterna indiferença, deixo-lhe o escrito por Nicolau Santos acerca do discurso de ontem do nosso primeiro.

    http://expresso.sapo.pt/keynesiano-gracas-a-deus=s25615
    "O doutor Passos é um estadista e um mariola"

    Este governo não é só incompetente. É também arrogante. E a arrogância impede qualquer emenda.

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  2. Just já tinha lido logo pela manhã a crónica do Nicolau Santos. :)

    Sim, a arrogância deste governo ditará o seu fim. Mas a demagogia tem de ser combatida, venha ela de onde vier.

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