Saí por impulso. Pelo menos tentei. Foram levar-me, pois ali
senti que era sítio para não estar. Sozinho, com a garganta a latejar e a
derrotar-me sempre que falava, cheguei às bilheteiras e entre as várias opções
nas quais tive de ponderar os horários para conseguir jantar antes do filme,
escolhi “Uma História de Amor” de Spike Jonze com Joaquin Phoenix, Amy Adams e
Scarlett Johansson. Contudo, por não ser o único filme a falar de amor ( não
falarão todos eles disso?) a rapariga da bilheteira perguntou-me “Esse ou o
Winter’s Tale?”. Cabisbaixo e ausente cuspi: “Sugere algum?”. “Sim sugiro o
Winter’s Tale” e eu feito Blanche Dubois
dependi da bondade da estranha e estúpido nem percebi que se tratava de uma
adaptação do “Conto de Inverno” de Shakespeare.
Jantei, mastiguei tempo e às 21h35m, dez minutos antes do
filme, estava a entrar na sala, vazia à excepção de quatro adolescentes que estavam sentadas do outro lado do
corredor na minha fila. Fila M lugar 8,
ou seja, no topo da sala. Se houve coisa que pensei e desejei era que gostaria
de poder ver um filme em silêncio, sem risos histéricos ou insolências e como a
minha inflamação metastizava pela alma,
não enxerguei na altura que eram só umas miúdas pequenas e que também eu já
fora assim, não miúda mas pré-adolescente barulhento entre amigos. Perdoem-me a
impaciência. Até viriam a portar-se bem, se ignorar que entornaram um balde de
coca-cola a meio do filme...
Vazia foi coisa que a sala deixou de estar, chegaram muitos
casais de todas as idades, famílias inteiras e o público multiplicou-se. Mas, na verdade, a sala continuou vazia comigo sozinho, no lugar 8, fila M.
Winter’s Tale uma história sobre milagres, sendo o maior
deles, o amor. Mas envolto em magia torna-se um filme muito diferente daqueles
que costumo ver. Espreitei de início desconfiado, depois agarrou-me e segui com
ele, sentado na minha cadeira, sozinho. A inflamação revoltava-se contra mim, a
garganta contorcia-se, eu tossia e chorava, estava febril. Então, a certa
altura numa materialização do espírito e numa espiritualização da matéria,
quiçá, as lágrimas escorriam-me pela face sem cessar. E eu não lutei porque era
guerra vencida. O guerreiro luta até poder, se for corajoso. Fui até onde pude.
E ali sozinho, adoentado apercebi-me que a maior doença é não sentir. É não
querer sentir, não querer salvar, não querer ser generoso. Percebo agora quando
alguém que me lê sempre diz que o que mais desejou toda a vida foi ser normal.
Percebo porque me faltam as palavras. São muitos dias a falar e a gerar
incompreensão. Então desisto. Não de sentir, mas de falar. E se o Peter não
desistiu de amar Beverly, uma jovem tísica destinada a morrer, então
permitam-me acreditar que tal como Beverly diz a Peter “tudo acontece por uma
razão” e a minha razão é não desistir.
P.S. – Agradeço à menina da bilheteira a sugestão, obrigado
por me fazer viajar e... sentir!
Então é um filme bonito e a ver:)
ResponderEliminarChorar no cinema é uma coisa tão vulgar, Francisco. O cinema é catártico.
E alguém me disse, cheio de razão, "é por nós que choramos, o filme só propicia o motivo".Que a vida pulsa sempre. E é tão bonito apreciar-lhe o pulsar. Senti-la em todos os poros.
Parabéns pelo post e pelo resto. Um beijinho
Esqueci-me: melhorinhas:))
ResponderEliminarObrigado Just pelas suas palavras. Sim, é por nós que choramos, sem dúvida. Decidi escrever algo fora do habitual, foi o que saiu. Beijinhos.
ResponderEliminarPorque morreu Paco de Lucia e gosto muito dele
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=e9RS4biqyAc Paco de Lucia, Concerto de Aranjuez
Um discurso que vale a pena:)
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=wYHdrs7UGAA Sampaio da Nóvoa na Universidade de Coimbra, A Universidade e a Liberdade