sábado, 22 de fevereiro de 2014

Uma noite de cinema!




Saí por impulso. Pelo menos tentei. Foram levar-me, pois ali senti que era sítio para não estar. Sozinho, com a garganta a latejar e a derrotar-me sempre que falava, cheguei às bilheteiras e entre as várias opções nas quais tive de ponderar os horários para conseguir jantar antes do filme, escolhi “Uma História de Amor” de Spike Jonze com Joaquin Phoenix, Amy Adams e Scarlett Johansson. Contudo, por não ser o único filme a falar de amor ( não falarão todos eles disso?) a rapariga da bilheteira perguntou-me “Esse ou o Winter’s Tale?”. Cabisbaixo e ausente cuspi: “Sugere algum?”. “Sim sugiro o Winter’s Tale” e eu feito Blanche Dubois dependi da bondade da estranha e estúpido nem percebi que se tratava de uma adaptação do “Conto de Inverno” de Shakespeare.
Jantei, mastiguei tempo e às 21h35m, dez minutos antes do filme, estava a entrar na sala, vazia à excepção de quatro adolescentes  que estavam sentadas do outro lado do corredor na minha fila. Fila M  lugar 8, ou seja, no topo da sala. Se houve coisa que pensei e desejei era que gostaria de poder ver um filme em silêncio, sem risos histéricos ou insolências e como a minha inflamação metastizava  pela alma, não enxerguei na altura que eram só umas miúdas pequenas e que também eu já fora assim, não miúda mas pré-adolescente barulhento entre amigos. Perdoem-me a impaciência. Até viriam a portar-se bem, se ignorar que entornaram um balde de coca-cola a meio do filme...
Vazia foi coisa que a sala deixou de estar, chegaram muitos casais de todas as idades, famílias inteiras e o público multiplicou-se. Mas, na verdade, a sala continuou vazia comigo sozinho, no lugar 8, fila M.
Winter’s Tale uma história sobre milagres, sendo o maior deles, o amor. Mas envolto em magia torna-se um filme muito diferente daqueles que costumo ver. Espreitei de início desconfiado, depois agarrou-me e segui com ele, sentado na minha cadeira, sozinho. A inflamação revoltava-se contra mim, a garganta contorcia-se, eu tossia e chorava, estava febril. Então, a certa altura numa materialização do espírito e numa espiritualização da matéria, quiçá, as lágrimas escorriam-me pela face sem cessar. E eu não lutei porque era guerra vencida. O guerreiro luta até poder, se for corajoso. Fui até onde pude. E ali sozinho, adoentado apercebi-me que a maior doença é não sentir. É não querer sentir, não querer salvar, não querer ser generoso. Percebo agora quando alguém que me lê sempre diz que o que mais desejou toda a vida foi ser normal. Percebo porque me faltam as palavras. São muitos dias a falar e a gerar incompreensão. Então desisto. Não de sentir, mas de falar. E se o Peter não desistiu de amar Beverly, uma jovem tísica destinada a morrer, então permitam-me acreditar que tal como Beverly diz a Peter “tudo acontece por uma razão” e a minha razão é não desistir.


P.S. – Agradeço à menina da bilheteira a sugestão, obrigado por me fazer viajar e... sentir!

5 comentários:

  1. Então é um filme bonito e a ver:)

    Chorar no cinema é uma coisa tão vulgar, Francisco. O cinema é catártico.
    E alguém me disse, cheio de razão, "é por nós que choramos, o filme só propicia o motivo".Que a vida pulsa sempre. E é tão bonito apreciar-lhe o pulsar. Senti-la em todos os poros.

    Parabéns pelo post e pelo resto. Um beijinho

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  2. Obrigado Just pelas suas palavras. Sim, é por nós que choramos, sem dúvida. Decidi escrever algo fora do habitual, foi o que saiu. Beijinhos.

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  3. Porque morreu Paco de Lucia e gosto muito dele

    http://www.youtube.com/watch?v=e9RS4biqyAc Paco de Lucia, Concerto de Aranjuez

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  4. Um discurso que vale a pena:)

    http://www.youtube.com/watch?v=wYHdrs7UGAA Sampaio da Nóvoa na Universidade de Coimbra, A Universidade e a Liberdade

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