A previsibilidade é um aborrecimento atroz. Não haver a
mínima hipótese de surpresa, de reinvenção, é como começar a ler um livro a saber-se o
final. Perde-se a vontade de ler. E perde-se a vontade de conviver, de
conversar, de estar aberto a. Há várias previsibilidades que hoje me fazem
enterrar a vontade. A previsibilidade dos amigos dos copos, por exemplo. Não
sendo eu um rapazinho de copos, não posso aceder a que se lembrem de mim apenas
quando lhes é conveniente. Eu não quero amigos de copos, amigos que estão
sempre ocupados para tudo o resto, que nunca agem, mas reagem, que nunca se
lembram mas são relembrados. Amigos dos copos é uma metáfora, não sou
permanentemente sisudo e avesso à diversão, simplesmente caminho até meio da
ponte e há pessoas que nunca o fazem. Minto, caminhar a meio da ponte é o meu
desejo, o problema é que por bondade, por vezes, faço toda a travessia até à
outra margem. Mas não o faço para sempre. Há quem o faça, enganando-se,
tentando mascarar a realidade, dependendo do outro. Eu, no entanto, sou mais
radical, mais duro, vou mesmo ao osso e quando vejo que é para cortar, sou de
uma firmeza incisiva. Talvez seja amor próprio, dignidade, respeito. Contudo,
vejo a vida como árvore de folha caduca, que se renova em estação diária, até
ao fim. E nesse fim, que muitas vezes pode estar mais próximo do que pensamos,
pode estar a explicação desta minha obstinação e exigência em relação à
verdade. À verdade das coisas, das relações, dos sentimentos, dos gestos. Não
tenho aptidão para suportar uma paz podre, por isso quando as folhas da minha árvore
caem, levam aquilo que jamais pode continuar em mim.
Livros, estrofes e poetas? Cinema, palco ou artistas? Políticos, ideias e petições? Quando houver algo para contar, eu depois digo-vos.
domingo, 29 de junho de 2014
quinta-feira, 26 de junho de 2014
Falsa Tolerância
Confesso que me irrita a falsa tolerância. Aquela com que
muitas vezes nos brindam quando gostam de nós. "Aceito-te" porque
gosto demasiado de ti para te dispensar. Fechemos os olhos a essa diferença! Pelo menos até passar
um desconhecido também diferente, tão diferente quanto eu, mas muito mais
insuportável de tolerar. Aí surge a ignorância enraizada, a miopia trituradora
que nada deixa ver além daquilo que se quer e já se viu.
Cai um olhar de repulsa, um distanciamento mínimo de
segurança e tu, ali ao lado, vês que és igual ao adversário, só que com
clemência. E o que cria esse apaziguamento? A tolerância? Não, talvez a
amizade, o amor, que vão matizando as cores demasiado vivas do que não se
aceita.
segunda-feira, 23 de junho de 2014
Exílio
Vivo num exílio, não tenho Pátria. Somente a recordação dela
na algibeira, para quando o coração mirra entristecido.
Faltam-me as palavras e a vontade delas. A irrelevância e a
estupidez prosperam até nos meandros mais recônditos. Tudo redundou num
profundo e exagerado NADA. Tontinhas quarentonas publicam fotos e estados de
alma nas redes sociais, o povinho esbate-se em questiúnculas de merda e
criam-se ajuntamentos para fazer a quadratura do círculo da insignificância.
O "penso, logo existo" degenerou em
"esperneio, logo existo" e há uma luta intestina, em bicos de pés
para se aparecer. Então, no meio de tais vultos reduzidos, onde tudo é tão
(des)interessante, restou-me uma passagem de ir sem voltar...
sexta-feira, 13 de junho de 2014
Lá Fora
Acordar todos os dias é um desafio, principalmente, em dias
de mundo inóspito como os de hoje. Dormir é como voltar à barriga da mãe
diariamente, para a redoma que nos protege da selva e nos permite ser leves,
voar, ter aconchego. É duro acordar e
sentir este miasma acinzentado em que tudo se tornou, pesam as palavras
estúpidas e sem sentido, a desfaçatez, o egoísmo, o chico-espertismo, a maldade
e a ignorância. Será que a insignificância veio para ficar?
A competição tornou-se escrava da inveja, olha-se para o lado
não para conhecer, mas para verificar se existe algum perigo de ultrapassagem nesta
corrida desenfreada do nada, um nada que é tudo para a maioria. Ocorre-me a
imagem da mão a fechar-se sobre um punhado de areia, bem que podem apertar,
domar, mas a areia escapa, não lhes pertence. A ideia da posse envenena tudo,
iludirmo-nos com esse poder e desejarmos possuir talvez seja a prova do quanto
nos sobrevalorizamos. Então é como se nos víssemos rodeados de pessoas
inflacionadas, uma inflação de avareza, inveja e ignorância, que no seu
conjunto nada acrescentam de útil aos indivíduos, apenas os redundam na sua
frivolidade.
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